Prof. Dr. Paulo Rocha
Doutor e Mestre em Odontologia pela Faculdade de Odontologia de Bauru da Universidade de São Paulo (USP – Bauru)
Especialista em DTM Dor Orofacial, Prótese Dentária e Implantodontia
Professor Associado II do Departamento de Clínica Integrada e Propedêutica da Universidade Federal da Bahia (UFBA)
Coordenador do Curso de Especialização em Prótese Dentária e Implantodontia da Associação Brasileira de Odontologia – Bahia
Para o periodonto, o ideal é que o término cervical do dente preparado esteja localizado supra gengivalmente. No entanto, a maioria das restaurações protéticas exige a sua localização sub gengival, o que implica no seu afastamento para a perfeita execução da moldagem. O afastamento deve ser vertical e horizontal do tecido gengival, permitindo acesso adequado ao dente preparado, expondo todas as superfícies, preparadas ou não. Como o material de moldagem não tem capacidade para promover esse deslocamento tecidual, as técnicas de afastamento gengival são necessárias e objetivam expor a região cervical e criar espaço para que o material de moldagem tenha espessura suficiente e não rasgue durante a remoção, permitindo a reprodução de detalhes da área.
O afastamento gengival pode ser realizado por meios mecânicos, químicos, mecânico-químicos e cirúrgicos, O afastamento mais utilizado para as moldagens com silicones por adição são com o uso do fio de retração, com ou sem hemostático, ou seja, mecânico ou mecânico-químico, com o uso da cloreto de alumínio. Mais recentemente temos a Pasta Adstringente de Afastamento Gengival (3M ESPE) (composta por 15% de cloreto de alumínio hexahidratado e 85% de partículas de carga, água e modificadores) (Fig 1).
Figura 1 – Pasta adstringente
Para melhorar o afastamento gengival, controle da umidade e sangramento, foram desenvolvidos fios de algodão e sintéticos embebidos ou não com substâncias químicas e pastas afastadoras. Esse método mecânico-químico é conhecido como técnica de afastamento gengival com fios retratores, e as substâncias químicas utilizadas nos fios podem ser vasoconstritoras (epinefrina) ou adstringentes (sulfato de alumínio, cloreto de alumínio e sulfato férrico). Esses materiais contêm sais de alumínio ou ferro e provocam isquemia temporária, promovem contração dos tecidos por precipitação de proteínas da membrana celular, causando redução do exsudato, secreções e fluxo sanguíneo capilar. O mais utilizado na atualidade é o cloreto de alumínio, por não interferir na cura dos silicones por adição e não provocar manchamento. Deve-se evitar o uso prolongado destes, para reduzir danos à integridade da margem gengival.
A literatura apresenta uma grande variedade de técnicas e materiais, sendo sua escolha relacionada ao caso a ser moldado e à adaptação individual de cada profissional para execução da técnica. As mais utilizadas são: de dois passos ou dupla impressão e de passo único ou impressão única ou dupla mistura. Ambas as técnicas necessitam do uso de fio retrator.
Necessário para expor o término do preparo e as regiões não preparadas do espaço biológico a serem copiadas, deve-se selecionar o diâmetro compatível com as características do sulco gengival. Após a remoção das coroas provisórias deve-se limpar os dentes preparados. É conveniente que o fio proporcione um afastamento suficiente do sulco, para que o material de moldagem não rasgue durante a remoção do molde. Em seguida, faz-se o isolamento do campo com rolos de algodão e seleciona-se um comprimento de fio necessário para circundar todo o dente preparado. A introdução do fio no sulco é realizada com a ponta de uma espátula para inserção, com leve pressão e movimentos de deslizamento, iniciados a partir da ponta do fio, introduzida na parte lingual/palatina ou proximal do dente, até encontrar a outra ponta. Como o tecido gengival dessas áreas é mais fibroso, o trauma causado pela pressão exercida pelo instrumento para sobrepor as duas extremidades do fio será menor. Para facilitar a introdução do fio ao longo do dente, pode-se utilizar uma segunda espátula, enquanto a primeira mantém em posição a parte do fio já inserida, evitando-se assim o deslocamento do fio pela pressão para inserção. Quando necessário, o fio pode ser embebido com solução adstringente ou hemostática antes da colocação no sulco gengival.
Após a introdução do fio, ele deve ser mantido em posição por pelo menos 5 minutos. A remoção do fio deve ser feita com muito cuidado, após umedecê-lo, para evitar que haja adesão ao epitélio sulcular e, consequentemente, lesões ao tecido. Toda a área deve ser lavada com água e seca, e o material de moldagem injetado no sulco gengival com uma seringa ou diretamente na moldeira (Fig 2 e 3).
Na técnica de afastamento gengival com dois fios, um fio mais fino (de 0,5mm) é inicialmente inserido na base do sulco, para manter o afastamento da gengiva no sentido vertical. A seguir, um segundo fio com diâmetro maior (os fios normalmente têm tamanhos de 0, 00 e 000 com espessuras aproximadas de 1.2, 0.8 e 0.5 mm respectivamente) é inserido para promover o afastamento lateral da gengiva, mantendo o primeiro no sulco durante a moldagem. O primeiro fio deve ficar localizado abaixo da margem do preparo, e o segundo deve ficar exposto, ou seja, no nível da gengiva marginal. Deve-se visualizar o segundo fio de forma contínua em volta do término do preparo, garantindo-se assim um afastamento gengival uniforme, para permitir o escoamento do material de moldagem em espessura suficiente no sulco (Esquema 1) .
Figura 2:(A) Fio colocado no sulco gengival. (B) Remoção do fio umedecido com água.(C) Após a remoção do fio. Observe o afastamento gengival conseguido. (D) Lavagem para remover substâncias adstringentes e fluido crevicular do sulco.
Figura 3: Molde concluído. Observe a cópia de todo o término do preparo.
Esquema 1: Afastamento gengival com dois fios. (A) Primeiro fio menos calibroso inserido no sulco gengival. (B) Inserção do segundo fio mais calibroso, afastando a extremidade gengival do término do preparo. (C) (D) Remoção do segundo fio para inserção do material leve. (E) Moldagem concluída com material pesado na moldeira.
Figura 4: Afastamento gengival com dois fios.(A) vista após a introdução do primeiro fio, que deve permanecer totalmente acomodao no interior do sulco e abaixo do término. (B) Segundo fio mais calibroso posicionado. Observe que parte do fio fica inserida no sulco e parte fica exposta para promover o afastamento da gengiva no sentido lateral.
Caso a gengiva esteja cobrindo parcialmente o fio em alguma região, pode-se optar pela troca do segundo fio por outro mais calibroso ou acrescentar um terceiro fio na região de sulco mais profundo (geralmente na região proximal) ou inserir pedaço de algodão enrolado, para permitir o afastamento efetivo e garantir uma moldagem adequada. Essa técnica deve ser empregada com muito cuidado para não traumatizar o epitélio sulcular, em razão do excesso de pressão mecânica que pode ser causada pela inserção de ambos os fios. Por isso, a seleção do diâmetro do fio é muito importante e deve ser feita de acordo com as características do tecido gengival (Fig. 5).
A obtenção de um bom molde está diretamente relacionada à qualidade da saúde do tecido gengival, que, por sua vez, depende do nível do término cervical no interior do sulco, da qualidade de adaptação das coroas provisórias e da qualidade da higiene oral do paciente. Se o término estiver localizado minimamente dentro do sulco e o tecido estiver saudável, a colocação de um único fio já será suficiente para a obtenção de um afastamento vertical e lateral da gengiva marginal.
Figura 5: Fio de algodão enrolado para promover um maior afastamento das regiões do término cobertas parcialmente por gengiva.
Figura 6: (A) Vista após a remoção do segundo fio. Deve-se observar que o primeiro fio permaneceu no interior do sulco e distante do término do preparo. (B) Introdução do material leve no interior do sulco gengival. (C) Material leve posicionado sobre todo o preparo.
Figura 7: Pentamix dispensando o material denso
Figura 8: (D) Moldeira estabilizada em boca, com material leve e pesado. (E) Molde concluído.
Figura 9: vista aproximada do molde obtido pela técnica de dois fios e passo único de moldagem.